Se há um filme multifacetado e soberbo em todas as suas facetas, esse filme é, sem dúvida, “Flee – A Fuga“. Ora é um filme de animação com um estilo muito único e que revela vários momentos da narrativa de forma sublime através das ondulações na forma como a animação é aqui apresentada, ora é um documentário que relata com delicadeza e honestidade a infância de Amin.
Este filme propõe-se a algo grandioso, porque envereda por diversos caminhos na maneira como se apresenta ao público, mas esse risco vale bastante a pena porque o resultado final é uma obra única, potente e comovente. A história centra-se na infância e adolescência de Amin, um jovem refugiado do Afeganistão, e nas suas diversas viagens e voltas que a sua vida dá até chegar à Dinamarca onde agora, com 36 anos de idade, relata a sua ‘fuga’ e os seus pensamentos naqueles anos turbulentos e na forma como também lidou com a sua puberdade e a sua homossexualidade.
A realização simples de Jonas Poher Rasmussen é certeira e enquadra-se perfeitamente no tom e na dinâmica que a história pede e precisa, nunca deixando o espectador demasiado angustiado ou distraído com o que está a ser contado. A animação é outra ferramenta potente que consegue enquadrar num estilo documental as várias nuances e os diferentes momentos que são relatados por Amin, conseguindo que o público se entregue e se envolva com a história. A banda-sonora é também outro grande destaque deste filme, onde o autor Uno Helmersson cria uma atmosfera perfeita e contagiante nos momentos certos e que também flui em sintonia com a história. E a história, sim a história real é, sem dúvida, o ponto mais forte do filme e a peça central deste filme muito dramático, mas nunca exageradamente dramático. Não é por acaso que esta obra já fez história na presente edição dos Óscares, tendo sido o primeiro filme a ser nomeado nas categorias de Melhor Documentário, Melhor Filme de Animação e Melhor Filme Internacional. Nunca antes um filme tinha sido nomeado nestas três categorias em simultâneo. Este é um marco histórico por si mesmo e, como disse inicialmente, o filme propôs-se a uma tarefa complicada mas conseguiu apresentar uma boa obra nos diversos campos e este momento histórico é um reflexo disso mesmo.
Aconselho vivamente este filme que julgo ser indiferente a qualquer pessoa que assista e que consegue deixar uma marca forte em cada um de nós. Pelo menos a mim foi assim. A história é triste sim e infelizmente é também um espelho dos nossos tempos e do sofrimento que algumas vidas têm desde tenra idade, onde tudo devia ser mágico e mais inocente, mas por vezes somos obrigados a crescer rapidamente e a adaptar-nos a um mundo cruel que nos empurra, sem pedir licença, para as responsabilidades e pensamentos de uma vida adulta. O filme foi exibido na presente edição do Festival MONSTRA e irá estrear nas salas de cinema em Portugal no próximo dia 7 de Abril.
Classificação: 5 em 5 estrelas. Texto escrito por André Marques.