A capacidade que as imagens têm para nos comover continua a surpreender-nos. Uma simples sequência de desenhos consegue carregar em si uma miríade de emoções e significados, e consegue chegar ao nosso coração das formas menos esperadas. Ice Merchants de João Gonzalez demonstra-nos isto de uma forma magistral. Seguimos o quotidiano invulgar de um pai e filho que vivem numa ravina, recolhendo gelo e vendendo-o numa vila na planície em frente da montanha onde habitam. Não existindo qualquer diálogo, o que poderia ser uma história inócua é tornada em algo que nos comove profundamente simplesmente através do uso da imagem e da animação.
Desde o início que somos deslumbrados pelo granulado que forma as linhas sinuosas da ravina e da casa dos dois protagonistas mudos. Com eficácia, somos sugados para o quotidiano solitário destes dois personagens. Somos familiarizados com a sua rotina, fazendo com que, sem nos apercebermos, nos afeiçoemos a estas duas pessoas com uma vida tão peculiar. Pequenas pistas sobre o seu interior emocional e o seu passado são subtilmente reveladas ao espectador e, dessa forma, este é envolvido por este mundo animado.
O seu isolamento do resto do mundo, radicalmente materializado pela casa na ravina e na vila que se vê sempre à distância e nunca de perto, acentua as emoções escondidas na bela animação de Ice Merchants e a forma como nos envolvemos com o filme – e a forma como este nos envolve no seu curto espaço de tempo em que nos enfeitiça. Muito do seu feitiço se deve à banda-sonora envolvente, composta pelo próprio João Gonzalez. Esta comunica-nos o que a imagem não comunica – o que seria transmitido por palavras. No fundo, a banda-sonora é o diálogo de Ice Merchants com o espectador, meticulosamente construída para o envolver emocionalmente na história que conta, pontuando os seus vários momentos, principalmente o seu clímax emocional.
Ice Merchants demonstra-nos o poder que a animação tem para criar algo simples e profundo ao mesmo tempo. Num curto espaço de tempo, é-nos revelada uma história rica em amor, dor e saudade, transportando em si e nas suas imagens um poder tremendo. João Gonzalez produz assim uma obra-prima da animação nacional, que possui força na sua sinceridade emocional e na conjugação magnífica de todos os seus elementos para nos trazer algo que verdadeiramente perdura em nós. Às vezes, nos invólucros mais pequenos encontramos as emoções mais fortes e humanas.
Classificação: 5 em 5 estrelas. Texto escrito por Jasmim Bettencourt.
Espero vê-lo o mais breve possível. Sim ,acredito que a animação tem o poder de ser simples e profundo ao mesmo tempo. Pode ter muita força emocional. Tenho um blog sobre filmes. Almadofilme.blogspot.com
Comento filmes. Moro no Porto. Obrigada . Cumprimentos,