Ante Scriptum: Caso ainda não conheça o filme em análise, o autor recomenda vivamente que o veja às escuras, no sentido literal e nos sentidos ignorante e absorto do termo. As escuras são dos melhores pontos de partida para nos deixarmos arrebatar pelo inesperado.
A viagem começa naquela zona da testa onde cabem a dúvida, o regozijo e a tristeza – qual santíssima trindade das emoções que acrescenta camadas a um caminho dado por fácil e limpo. Os corpos dos modelos e o escrutínio mais básico dos sorrisos amarelos é o ponto de partida mais fresquinho e polido para as descargas frenéticas de um iate luxuoso ou de quem paga a refeição sem um suspiro técnico ou um revirar de olhos.
Tudo fútil, das igualdades prometidas em neons ao cinismo mascarado de otimismo. Prenúncio para as ansiedades de um limpa para-brisas que geme, os zumbidos das moscas e até o urrar de um burro que atormenta a bolha elitista.
O grande capital está vivo nesta película e preso a um sistema de castas que só depende da capacitação em casos de apuros. Afinal, é aí que os relógios caros se tornam obsoletos e que se poderão encontrar perfumes na lixeira…
É bem notória a malícia de se brincar com a comida antes de voar o prato ou a de estender a agonia por fios de aborrecimento irónico com joias e esterco a acompanhar. As parelhas são arrojadas, atiram-se de cabeça à dualidade e colam no céu da boca – o magnata russo e o capitão comunista (não, marxista!), os enjoos em mar alto e a prontidão trapalhona da tripulação.
“In den wolkem”, o charme fútil de se estar tão perto da salvação mas as pontas dos dedos escorregam no último segundo e fica-se à deriva, dependente de um sistema de classes ou de uma correria em aberto.
“Triângulo da Tristeza” está actualmente disponível para streaming na FILMIN.