Masterclasses de Cinema da 1ª edição da RONCA

RONCA – Conversa com David Bonneville

Cinema Português Entrevistas

O Cinema em Portugal foi falar um pouco com o realizador David Bonneville sobre o Cinema Português e o seu estado, numa pequena antevisão sobre a masterclasse de Cinema que o realizador vai dar neste próximo dia 16 de Março no Auditório São Mateus em Elvas, como parte da programação da 1ª edição da RONCA – Mostra de Cinema de Elvas, numa de duas masterclasses que fazem parte deste certame cinematográfico.

Quais os principais desafios que o Cinema Português deverá ter de enfrentar na próxima década?

David Bonneville: Os desafios serão pelo menos os mesmos da última década. O concurso às primeiras obras de ficção cinematográfica do Instituto do Cinema e do Audiovisual acontece uma vez por ano e atribuem o seu maior apoio (550 mil euros) a apenas 4 projetos – o que representa em média uns meros 4% dos candidatos.

Portanto a garantia de produção de novos autores é escassa. As alternativas de produção são os meios próprios ou através de fundos privados. Não existem apoios financeiros de outros programas nacionais. Em França existem fundos regionais. Em Inglaterra há apoios regionais para filmes de longa-metragem rodados fora da capital. No Brasil há apoios estaduais. Enfim, poderia haver aqui inspiração para criar uma lei de mecenato regional que apoiasse financeiramente longas-metragens, com valores de exequibilidade estrutural de base, e não apenas valores menores complementares.

Como vê o impacto do streaming para a produção e divulgação de cinema português?

David Bonneville: É uma plataforma essencial para dar a conhecer a filmografia portuguesa à população mais alargada. Cada vez mais se consome cinema em dispositivos móveis. Nem toda a gente tem laptops e smartphones ou mesmo acesso a rede de internet, mas a tendência é haver cada vez mais público a visionar filmes nestes suportes. E se os cinemas das localizações de província, quando os há, se dedicam a exibir blockbusters americanos, o streaming vem oferecer a alternativa de acesso a uma cinematografia nacional, mais pontualmente exibida, ou de difícil acesso.

De que formas se pode aproximar mais o público português do Cinema Português?

David Bonneville: Só produzindo mais se consegue oferecer diversidade e volume satisfatório de filmes para serem vistos. Sem apoios à produção não há filmes, sem filmes não há oferta, e sem oferta não se pode de maneira nenhuma criar hábitos e gosto pela produção nacional. O cinema português é muito diverso, e deve continuar a sê-lo, com o fim de captar diferentes tipos de público. Há um esforço grande da parte dos autores para criarem filmes de qualidade e originalidade, e há filmes que considero muito bons, mas cuja longevidade de exibição se resume a poucas semanas em sala, para depois desaparecer de cena. Temos uma grande falha na promoção e distribuição de muitos filmes devido aos constrangimentos orçamentais e às estruturas de produção, que sendo pequenas, não conseguem investir tempo, dinheiro, nem dinâmica de trabalho para garantirem estratégias, campanhas mínimas de visibilidade dos filmes.

E de que forma se pode desenvolver e apostar mais na educação cinematográfica em Portugal?

David Bonneville: Deveriam haver disciplinas de Cinema nas escolas do ensino básico e nos liceus de todo o país. Promover a literacia audiovisual a par dos estudos de literatura; como disciplina autónoma – tal e como defende Alain Bergala. Aprender a ver cinema desde pequeno, incutir o gosto pelo cinema de autor, nacional, e não só, tal como o sistema que Bergala implementou em França, junto do Ministério da Educação Francês.

Qual a importância e impacto que iniciativas como a RONCA representam para o panorama nacional do Cinema?

David Bonneville: São iniciativas cruciais. Os festivais de cinema fazem parte do atrativo que pode chamar pessoas a ver filmes nacionais. Todas as localidades deveriam ter um evento cinematográfico a acontecer pelo menos uma vez durante o ano. A divulgação e promoção junto das populações é um trabalho que tem de ser feito em simultâneo com as entidades municipais e organizadores dos festivais. Não adianta haver muitos festivais a acontecer e termos as salas vazias, como por vezes acontece. O festival Caminhos do Cinema Português convida turmas de escolas do ensino básico e secundário locais a escolherem um filme para verem em coletivo numa das suas sessões. Isso cria hábitos, põe os alunos a debater, sensibiliza-os a virem ao festival, a verem cinema em sala. É uma aula especial, fora da sala da aula, e onde se oferece a experiência de ver um filme português em sala – talvez a primeira vez da maioria destes jovens – mas também se desenvolvem outras competências criativas, artísticas, críticas e vivenciais.

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