O Cinema em Portugal esteve à conversa com alguns dos actores do filme português “Chuva de Verão” na antestreia do filme no Cinema São Jorge, Lisboa. Numa segunda conversa falámos com Francisco Faria, Filipe Amorim e Inês Aguiar em relação à narrativa que se foca em relacionamentos de jovens adultos ao longo de uma semana num Verão e o que este tema tem de atractivo e envolvente, assim como o que representam cada uma das personagens que interpretam nesta trama.
O filme é a primeira longa-metragem realizada por António Mantas Moura e está actualmente em exibição em salas de cinema em Portugal.
Francisco Faria: Para mim foi super desafiante porque, para além de ter sido o meu primeiro projecto enquanto actor, o Johnny era uma personagem muito específica. Todos o vêem como o elemento perturbador do grupo e ele é visto como convencido, arrogante, e ele foi para esta semana em que o filme se passa, contrariado. Tem uma relação tóxica com a namorada, que foi algo que eu também nunca experienciei muito na minha vida pessoal. Sou uma pessoa muito positiva e o Johnny nestes aspectos estava muito distante de mim, ou seja, para mim foi muito interessante e desafiante conseguir experienciar isto tudo e eu acho que de certa forma até foi difícil, mas tive muito suporte dos meus colegas, também tive formação, do António que também me orientou super bem e eu acho que vejo ali de facto uma personagem.
Eu acho que, apesar de ser uma personagem distante, todos nós ao vermos o filme vamos encontrar aspectos em que nos identificamos e nos relacionamos, e no final acabei até por ganhar alguma empatia com o Johnny. E ele é assim, ou ele reage assim e tem um motivo, ou seja, depois há aqui toda uma compreensão com a personagem também e à medida que eu fui trabalhando a personagem e estudando e construindo, deu para de certa forma ganhar uma ligação maior a uma coisa que eu achava que era tão distante. Se calhar eu já senti estas emoções todas, mas numa proporção menor.
Para mim foi tudo novo, ou seja, eu venho da área da Moda e tudo era diferente. Os sets são diferentes, o dia-a-dia é diferente, as relações são diferentes, ou seja, para mim foi tudo uma surpresa e tudo muito cativante e muito expansivo. Há muito tempo que não me sentia assim vulnerável com uma coisa que me deixasse tão desconfortável.
Filipe Amorim: O personagem Chico foi a pessoa com quem eu mais me consegui relacionar. É alguém que quer o bem de todos, é alguém que vem de fora. Por isso, está numa posição de fragilidade e tende a ser um bocadinho o elo de ligação com todos e por vezes quase que ignorar e fazer-se de burro e esquecer as coisas más que estão a acontecer para não causar conflito, mas a tolerância tem um limite e o limite chega.
Eu acho que, na vida real, nós nunca dizemos realmente o que pensamos e não olhamos as pessoas nos olhos. Tudo o que existe, existe em entrelinhas e em subtextos, e o Chico, neste caso, é jornalista e é escritor. Então ele vai apontando no caderninho dele as coisas que ele se vai apercebendo. Por isso, ele tem muito aquela coisa do silêncio, da introspecção e de guardar as coisas para ele, e só no final é que admite que descobriu tudo e não que lhe contaram. Teve que ser tudo descoberto por ele, através de uma pesquisa que ele foi fazendo com todas as personagens. Por isso, sim, vive tudo das entrelinhas.
Eu até perguntei ao António, porque eu sabia onde é que ele queria chegar com o Chico, mas não sabia onde é que ia começar. E perguntei-lhe numa reunião que tivemos, e ele disse “O Chico é um banana.”. Eu acho que essa foi a melhor direcção de actores que eu já tive. Acho que era importante haver o Chico e acho que é engraçado que o Chico manteve-se um outsider. A única diferença é que ele assumiu o outsider, e passou a gostar e a sentir-se confiante como alguém de fora, enquanto que ao início queria agradá-los e depois percebeu que não é o seu grupo, que há pessoas que não são as nossas pessoas e que está tudo bem.
Inês Aguiar: A Lua é o elemento reconciliador do grupo. É a personagem que tenta reconciliar e juntar o grupo novamente. Houve um ligeiro afastamento devido ao episódio que aconteceu, e ela reúne novamente como é tradição, os amigos em casa dela. Ela é a anfitriã, ela é a que tenta (e vai-se percebendo ao longo do filme) esconder sempre aquilo que está a sentir até não conseguir mais e explodir. Tenta lidar com a opinião de todos, tenta encaixar ou agradar a todos, mas a da altura isso deixa de ser possível e ela vive muito um conflito interno. Um conflito muito grande, desde levar um namorado que é novo para o grupo de amigos que já está formado, e este namorado vem substituir alguém, e esse alguém era muito importante para todos eles. Cada um dos elementos do grupo tem uma opinião sobre o que aconteceu e sobre a maneira como ela lidou com essa situação. E de repente ela tem de lidar com todas essas opiniões, e lidar com as suas próprias emoções e sentimentos.
Eu revejo-me imenso na história do filme, porque eu também tenho um grupo de amigos que se reúne todos os Verões, portanto isto acontece bastante e depois há sempre dinâmicas diferentes, há sempre um ou outro que se dá mais do que o outro e não estás sempre a par das histórias e da vida de todos da mesma maneira, e isso é muito visível também neste filme, há personagens mais próximas, mais afastadas, e isso é a vida.