Red Rooms (Les chambres rouges) brinca com o conceito de true crime, confrontando-nos de uma forma perturbadoramente brilhante com o nosso próprio fascínio pela violência. Pascal Plante consegue criar uma obra assustadora e inquietante sem derramar uma única gota de sangue no ecrã, questionando os limites éticos do conteúdo contemporâneo.
O mais recente trabalho do realizador centra-se nos crimes sádicos do “Demónio de Rosemont”, Ludovic Chevalier (Maxwell McCabe-Lokos), tendo início durante o julgamento do assassino pelos homicídios de três adolescentes num “Red Room” – um chat online na dark web onde espectadores pagam para assistir, em tempo real, a assassinatos brutais. A narrativa acompanha Kelly-Anne (Juliette Gariepy), uma modelo que desenvolve uma obsessão inexplicável pelos mediáticos crimes de Ludovic, ao lado de Clémentine (Laurie Babin), uma jovem misteriosa que se apaixonou pelo assassino e acredita firmemente na sua inocência.
O filme inicia-se com a primeira audiência do julgamento, que nos apresenta um assassino perturbadoramente mudo – característica que se mantém ao longo da narrativa –, e os relatos minuciosos dos seus atos macabros, bem como as impactantes intervenções de ambas as defesas. Com um excecional trabalho de câmara, toda a cena é gravada num plano sequência de tirar o fôlego, estabelecendo desde logo a atmosfera perturbadora que perdura durante toda a experiência.
Numa provocação audaz e satírica ao género true crime, Pascal Plante evita deliberadamente expôr o espectador à violência direta. Em vez disso, oferece uma representação notável de como este fascínio mórbido afeta as pessoas, deslocando o foco dos crimes em si para a perceção obsessiva do público, numa crítica feroz ao sensacionalismo mediático, à perda de sensibilidade perante o desumano e ao consumo de violência como forma de entretenimento, forçando-nos a confrontar as nossas próprias motivações enquanto consumidores deste tipo de conteúdo.
O aspeto mais fascinante desta obra reside no paradoxo que cria: apesar do sentimento constante de repulsa, revolta e inquietação, torna-se impossível desviar o olhar, reforçando precisamente a teoria que o próprio filme levanta e obrigando-nos a questionar a nossa própria cumplicidade moral.
A fotografia cria uma estética fria e claustrofóbica, enquanto a banda sonora reforça o ambiente intenso de terror psicológico. Além disso, conta com interpretações excepcionais, com ênfase na atuação impressionante da Juliette Gariepy.
Red Rooms estabelece um paralelismo brutal entre a protagonista e nós, espectadores, culminando numa pergunta central: será Kelly-Anne assim tão diferente de nós, consumidores regulares de crimes e violência?
Pascal Plante criou uma obra que não apenas entretém, mas força uma introspeção desconfortável sobre os nossos próprios impulsos, hábitos e desejos. É cinema que incomoda, questiona e, acima de tudo, permanece connosco muito depois de abandonarmos a sala.
Classificação: 4.5 em 5 estrelas. Texto escrito por Duarte Cardoso.